sábado, 8 de agosto de 2015

Crônica: Escolhas Diárias


     Ela passou muito tempo perdida no vão que divide a incerteza do conhecimento. Buscava entender as diversas coisas que aconteciam ao seu redor, questionava a tudo e a todos. Desde o princípio, aprendeu a fazer sozinha suas escolhas diárias. Às vezes era confusa demais (e ainda é). Outras, questionadora. Às vezes as respostas às perguntas e as decisões estavam apenas a um passo, fáceis de serem tomadas. Noutras, distantes, e era preciso procurar a fundo para encontrá-las.

   Pensou em palavras que poderiam ser ditas e não foram. Em momentos que batiam à porta, esperando apenas para ser vividos, e que não aconteceram. Em brigas que poderiam ser evitadas, ou sorrisos provocados pela menor das atitudes. Deveria ter seguido para a esquerda ao invés da direita? Tomar um ônibus ou ir a pé? Diariamente, o menor dos atos já nos leva a escolher. Até mesmo escrever este texto foi uma escolha. Quantas palavras, frases e até parágrafos inteiros foram apagados?

     É sempre assim quando tenta falar sobre esse assunto. Não se trata apenas de dizer sim ou não, de ficar longe ou perto. Esta é mesmo uma boa ideia? Todos que, de alguma forma passam por nossas vidas, deixam seu rastro, sua marca. Mesmo que não queiram. Por vezes é algo bom, que perpetua e nos completa por anos a fio. Mas quando a marca se torna uma ferida, só o que queremos é poder escolher não tê-la. É perdoar ou esquecer? 

   Há cerca de quatorze anos ele fez uma escolha, que, ao mascarar-se de definitiva, acabou se tornando diária. Ele escolhe diariamente não tê-la ao seu lado. Ela então abandonou as decisões que não poderiam ser tomadas, os momentos que não seriam vividos, as perguntas sem respostas e também as feridas causadas. A cada ano, quando se aproxima aquilo que socialmente escolhemos como um dia especial, escolhe esquecer. Mas, ao longo do tempo, perdoar teve de se tornar uma de suas escolhas diárias. Esta é a escolha de uma filha, para um pai que há muito se perdeu em suas próprias decisões.


6 comentários:

  1. Você deveria escrever mais crônicas moça, faz isso muito bem. Adorei a contexto ♥

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigada <3 Eu estou tentando me forçar a escrever mais textos desse tipo, mas, sabe quando você para em frente ao computador ou ao papel e a caneta e fica horas sem ter a mínima ideia do que vai escrever? Ai quando tenho uma ideia genial eu geralmente não tenho onde anotar, ou é em momentos em que eu não posso me dedicar a isso kkkk Um beijo : *

      Excluir
  2. Lettícia!!! Adorei! E faço minhas as palavras da Kelly: você deveria escrever mais crônicas.
    No contexto ou fora dele, muita gente vai se identificar. Parabéns!

    beijo ;*

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ei! Obrigada <3 <3 Vou me dedicar a escrever mais crônicas! Um beijo : *

      Excluir
  3. Eu não sei nem por onde começar. Desde a primeira linha eu me identifiquei e fui me entregando aos poucos... Quando teu texto já tinha me conquistado, dei de cara com o tal do "ele". E nessas horas a gente sempre pensa que é sobre algum amor desiludido, desses que a gente sofre toda hora, sabe. E mesmo me identificando um pouco menos graças a minha convicção boba, continuei lendo. Você me pegou. Me surpreendeu não pela palavra "pai", mas porque tocou na parte que eu menos esperava que tocaria. A verdade é que consegui me identificar com cada palavra, por completo. Você tocou bem lá na ferida, mas tocou com tanta empatia que eu me senti menos sozinha do que normalmente me sinto com esse sentimento que sei que você reconhece. Ainda é amor, ainda é desilusão. Mas você deve saber tão bem quanto eu que esse dói muito mais que todos, afinal, é eterno.

    Um abraço enorme! Eu amei o blog, e sou grata pela sua crônica <3

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É tão bom recebermos um comentário assim, ainda mais de uma crônica tão especial para mim e tão próxima a essa mesma data. Eu passei um bom tempo trabalhando nesse texto, vivendo um conflito de sentimentos intenso até que conseguisse organizar as ideias. Fico feliz de saber que você se identificou, e sim, reconheço as consequências que essa escolha diária nos causa. Muito obrigada, mesmo! Volte sempre e um beijo <3

      Excluir