“Três anos em Londres não mudaram Richard, embora tenham modificado o modo como ele via a cidade. Por conta das fotos que vira, ele tinha imaginado uma cidade cinza, até mesmo negra, mas ficou surpreso ao descobri-la cheia de cores. Era uma cidade de tijolos vermelhos e pedras brancas, de ônibus vermelhos e grandes táxis pretos (embora muitas vezes fossem, para surpresa de Richard, dourados ou verdes ou de um tom de vinho), de caixas de correio muito vermelhas e parques e cemitérios com gramados intensamente verdes”.
Sinopse: “Richard Mayhew é um jovem de bom coração com uma vida banal, que é transformada quando ele ajuda uma garota que encontra ferida na rua. No dia seguinte, Richard deixa de existir para o mundo, como se tivesse se tornado invisível. Aquele pequeno ato de bondade o lança em um mundo que ele jamais sonhou existir, uma Londres subterrânea em que figuras inusitadas surgem dos esgotos e das estações de metrô, um mundo povoado pela escuridão. Agora, Richard vai precisar aprender a sobreviver nessa nova cidade de sombras e surpresas, de assassinos e anjos, se quiser algum dia recuperar sua antiga vida na Londres que ele sempre conheceu”.
Título: Lugar Nenhum.
Autor: Neil Gaiman.
Páginas: páginas.
Editora: Intrínseca.
ISBN: 978-85-8057-899-7.
“Fazia quatro dias que ela estava correndo, em uma fuga impensada e desajeitada através de túneis e passagens. Estava faminta e exausta, um cansaço que nenhum corpo poderia suportar, e cada porta se mostrava mais difícil de ser aberta que a anterior. Depois de quatro dias em fuga, encontrou um esconderijo, uma pequena toca na pedra, ausente do mundo, onde estaria a salvo, ou ao menos assim pensava, e finalmente pôde dormir”.
Algumas Impressões
Neil Gaiman é um escritor brilhante, cujas histórias guardam uma capacidade intrínseca de encantar e fazer refletir sobre os mais variados assuntos. Quando concluí a leitura de “Deuses Americanos” (clique para ler a resenha), já estava absolutamente envolvida por sua narrativa, de tal modo que só o que desejava era conhecer cada vez mais tramas criadas por ele. Então, através da parceria com a Editora Intrínseca, solicitei três outros livros do autor, dentre eles “Lugar Nenhum”, que é a obra que pretendo resenhar nesta postagem - e digo isso porque é extremamente complicado expressar em palavras todos os sentimentos e questionamentos desencadeados por esta complexa leitura. Na trama, conhecemos Richard Mayhew, um homem de bom coração, gentil e que se preocupa (ou pelo menos enxerga) aqueles que são invisíveis para a sociedade. Longe de ter uma vida perfeita, mas que lhe cabia muito bem, Richard vivia todos os dias sob uma rotina maçante e comum, indo ao trabalho, voltando para casa, saindo com os amigos e com a noiva, Jéssica. Um belo dia, ele se depara com uma jovem ferida e largada na rua, e imediatamente a socorre. O que ele não poderia imaginar era que este simples ato de bondade mudaria sua vida para sempre, e se tornaria um enorme problema. Ao ajudar a jovem Door, uma habitante da chamada “Londres de Baixo” (lar dos esquecidos e daqueles que escapam pelas frestas da sociedade), Richard acaba se tornando invisível na “Londres de Cima”, pendendo sua casa, seu emprego e tudo aquilo que conhecia e compunha sua rotina. Sem ter a menor ideia de como isso aconteceu ou mesmo como concertar, ele terá de enfrentar a Londres de Baixo, com lugares peculiares e desconhecidos. Mas, e se ele não puder mais voltar para sua antiga vida? Como vai sobreviver neste mundo esquecido, cheio de túneis subterrâneos, bestas e pessoas invisíveis para a sociedade? Antes de mais nada, devo dizer que foi absolutamente maravilhoso acompanhar a descoberta das respostas para estas perguntas junto com o personagem. Completamente diferente da Londres como comumente conhecemos, a Londres de baixo proporciona um ambiente rico e detalhado, o que, somado à narrativa descritiva de Gaiman, faz com que a imaginação do leitor crie asas, permitindo a cada um fazer parte da história.
Leia também: Especial: Precisamos falar sobre Neil Gaiman | Canal do Fleur
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“Richard não fazia mais ideia de quem era. Não fazia ideia do que era o não era real, se ele próprio era valente ou covarde, louco ou são. Mas sabia o que precisava fazer. Entrou no vagão, e todas as luzes se apagaram”.
Com um ambiente mais sombrio e que carrega uma singularidade que nos enche de fascínio, traz particularidades raras aos livros de fantasia, como o método de comercialização por meio de trocas do Mercado Flutuante, e a realidade dura e amarga do esquecimento, a necessidade de resiliência e instintos apurados de sobrevivência daqueles que são esquecidos ou, mais precisamente, ignorados por completo pela sociedade. Apesar de se tratar de uma narrativa fantástica, a obra de Gaiman mescla a magia a uma verdade opressiva e que precisa ser enxergada e debatida. Ao mesmo tempo em que ratos nunca mais serão apenas animais e metrôs guardam diversos segredos datados dos tempos medievais, o autor chama a atenção do leitor para moradores de rua, crianças famintas, e tantos outros em busca de algo para se aquecer. Assim como Richard, fiquei fascinada pelo lugar, intrigada sobre Door, o marquês, Hunter e vários outros personagens os quais ele vai encontrando pelo caminho. À medida que as páginas avançavam, novas perguntas surgiam intrínsecas umas às outras, e quando me julgava apta a encaixar uma peça no grande quebra-cabeça do enredo, dava um paço atrás com as surpresas que ainda estavam reservadas. Foi engraçado, mas também acolhedor a seu próprio modo, acompanhar a jornada pelo ponto de vista de Richard, que se mostrava sempre cético e exasperado, inocente e impotente diante de tantas situações. Como uma criança ele descobria um novo mundo, e eu o descobria junto com ele. Na busca para recuperar sua monótona rotina, Mayhew precisa da ajuda de Door, que à princípio julga não precisar da dele em sua própria missão, outro ponto que me surpreendeu e encantou na trama. A busca por respostas é longa e perigosa, permeada de reviravoltas, traições e situações de tirar o fôlego, mas todo o caminho é compensado pelo brilhante desfecho pensado por Gaiman. Fiquei feliz principalmente pelo final em si. Pois, quando pensamos que encontramos a felicidade pelo resultado almejado desde o princípio, a vida, esta obra cheia de reviravoltas, nos mostra que nem sempre o que pensamos ser o melhor é mesmo o melhor para nós, e que a felicidade pode estar nas pequenas coisas, ou melhor.... Detrás das mais inusitadas portas.
Uma editora jovem, não só na idade – afinal foi fundada em dezembro de 2003 – mas no espírito inovador de optar pela publicação de ficção e não ficção priorizando a qualidade, e não a quantidade de lançamentos. Essa é a marca da Intrínseca, cujo catálogo reúne títulos cuidadosamente selecionados, dotados de uma vocação rara: conjugar valor literário e sucesso comercial.
Eu preciso e muito ler esse livro hahahah
ResponderExcluirNeil Gaiman é maravilhoso e preciso começar o meu projeto de leituras dele tbm
Esse livro é ótimo! Eu não esperava que fosse gostar dele tanto assim, mas me surpreendeu bastante por conta dos temas debatidos.
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